Ilha do Cardoso : Natureza Intacta ao lado de São Paulo

Vinte e dois mil hectares de mata atlântica para apenas quatrocentos habitantes.  Te parece uma boa proporção? Pode ficar ainda melhor!

A Ilha do Cardoso é um distrito da cidade de Cananéia, cidade localizada no meio do caminho entre São Paulo (258km) e Curitiba (260km), última cidade do litoral paulista antes da divisa com o Paraná. Geograficamente, a Ilha do Cardoso fica próxima a suas irmãs mais famosas, Ilha do Mel e Ilha Comprida, mas  com viés totalmente diferente: aqui a beleza é totalmente selvagem. É lá que fica o Parque Estadual da Ilha do Cardoso, porção mais rica em vegetação de Mata Atlântica e diversidade biológica do Sudeste brasileiro. Singulares costões rochosos,  grande variedade de animais selvagens, muita restinga e manguezais intactos,  uma quantidade imensa de aves que sobrevoam o mar todas as manhãs e finais de tarde, pôr-do-sol cinematográfico garantido quase todos os dias e um dos céus mais estrelados de São Paulo são diversão garantida para quem não se importa em deixar o celular em casa e abdicar da luz elétrica por alguns dias.

A maioria dos turistas que visitam o local costumam ficar no Vilarejo do Marujá, lado mais pop da ilha, cujas referências estão bastante espalhadas pela internet afora e não há qualquer dificuldade na preparação. Mas o mochileiro maluco quer mais, muito mais.

Dividida entre a porção oceânica – repleta de águas claras, mar bravo, costões rochosos e muita vegetação atlântica – e a porção de selva – basicamente formada por manguezais, fauna e flora abundantes – a Ilha do Cardoso é diversão garantida para quem gosta de natureza e pretende fugir da civilização sem rodar ou gastar muito. E já que o negócio é integração, a grande dica é ficar do outro lado da ilha, local ainda mais isolado! Confira:

Formada pela comunidade do Itacuruçá, com cerca de seis ou sete casas de pescadores e as instalações do PEIC, a Praia do  Perequê só pode ser alcançada de barco ou à pé. Pro lado de lá você encontra cedros, jequitibás, bromélias, biguás, atobás, papagaios-de-cara-roxa, fragatas,  bugios, veados, lontras, tartarugas marinhas, cobras diversas, jacarés do papo amarelo, onças pintadas e a estrela local: o boto cinza, figurinha fácil na Baía do Trapandé, que separa Cananéia da Ilha do Cardoso. No parque não é possível acampar e os alojamentos são só para pesquisadores, mas no pequeno vilarejo quase todos os pescadores cedem seus quintais para três ou quatro barracas, quantidade rigorosamente fiscalizada pelos funcionários do parque.

A estrutura é bastante simples, quase como um camping selvagem acrescido de um tanque para lavagem de roupas e uma pequena área descampada para armar acampamento. Não há qualquer sinal adicional de civilização ali: perfeito para entrar em contato com a natureza e descansar a cabeça da maluquice que é viver em São Paulo.

Acampado numa das casas, o aventureiro tem basicamente duas opções: passar um dia preguiçoso, deitado nas areias de Itacuruçá, tomando banho no  Rio Perequê, nadando com os botos cinzas  e tomando uma caipirinha de cataia; ou caminhar, caminhar, caminhar e caminhar.

Pra começar, uma rápida visita a Sede do Parque, que conta com um Museu de História Natural e alguns aquários com espécies marinhas da região e demais estruturas.  Depois, qualquer mochileiro pode pegar uma das trilhas curtas que consistem basicamente por caminhadas pela mata de restinga, com observação de plantas medicinais, líquens, orquídeas, bromélias, sambaquis (sítios arqueológicos), mergulhos em piscinas naturais e cachoeiras. Nada muito cansativo ou complicado, são todas atrações indicadas para aqueles que preferem caminhar com segurança e guiados por pesquisadores entendidos no assunto.

Se não for o seu caso, relaxe, o local oferece muito mais. É possível passar os dias caminhando entre extensas as praias de Itacuruçá (9km), Ipanema (12Km), Cambriú, Fole Pequeno, Foles, Lage e – finalmente – Marujá. Com muita disposição e algum planejamento dá até pra fazer essa travessia inteira num único dia, desde que o cálculo leve em conta a tábua das marés.

Um ponto interessante é a réplica do marco do Tratado de Tordesilhas (divisão da América do Sul entre Portugal e Espanha, realizada em 1494) no pontal da praia do Itacuruçá, erguido no mesmo local aonde encontrava o marco inicial instalado em 1501, o qual foi retirado em 1841 pelo Barão de Capanema e levado para o museu Imperial no Rio de Janeiro.

Para fazer a travessia completa das praias vá preparado, porque as distâncias são enormes e as dificuldade são inúmeras. Há grandes trechos de costões rochosos, trilhas por dentro da mata, grandes distâncias sem qualquer sombra à vista, pontos de água potável bastante escondidos e a natural preocupação com a maré, especialmente nos trechos em que a mata e as rochas colam na praia. Recomendável apenas para trilheiros experientes.

Partindo do Marujá há várias outras atrações, como a trilha norte do Cardoso até Cananéia (dois dias de caminhada), Ilha do Bom Abrigo, Ilha da Figueira, Ilha das Peças e do Superagui. Em Cananéia, visite também o vilarejo fantasma de Ararapira e se o seu negócio é 4×4, pesca ou canoagem, não deixe de explorar a desconhecida vila de Ariri.

Dicas Gerais:

– Falamos de uma ilha selvagem, especificamente do pedaço de terra mais bem preservado do litoral paulista.  Se você for no verão, lembre-se que pegar uma chuvinha é quase inevitável e que as altas temperaturas atraem uma imensa quantidade de insetos. Não falo aqui de insetos comuns, mas sim de uma variedade inacreditável de vorazes seres voadores de todas as cores, tamanhos e formas e quase todos picam sem dó. De todas as minhas incursões pela região, várias marcas de repelentes foram testadas e nenhuma garantiu tranqüilidade absoluta, especialmente no verão e nos horários de pico (início da manhã e final da tarde). Repelentes tradicionais à base de DEET como Off, Autan e Repelex fracassam miseravelmente na Ilha do Cardoso. Loções cujo princípio ativo é a citronela como o Cytropic e o Coala tiveram pouca efetividade. O único que pôs algum medo nos bichões foi o (caro) Exposis Extreme, à base de icaridina. Mesmo assim, numa visita de alguns dias entre dezembro e março, uma coleçãozinha de picadas é garantida. Vá preparado e se for se aventurar na mata, use uma calça de tecido sintético leve e pelo menos uma camiseta de mangas compridas.

– Roupas leves e confortáveis, roupas de banho e ao menos uma agasalho para à noite são indispensáveis. Acessórios para chuva podem ser muito úteis, inclusive na travessia de barco. Um par de botas para caminhada nas  trilhas e uma papete para caminhar na praia são ótimas pedidas. Um chapéu/boné para o sol, protetor solar e máquina fotográfica completam o estoque, além dos apetrechos de camping usuais, especialmente uma boa lanterna.

– Para enfrentar o mangue recomenda-se o uso de roupas velhas, usualmente descartadas após a trilha por conta do característico e persistente cheiro de matéria em decomposição, que normalmente fica impregnado.

– Para chegar lá é fácil. A partir de São Paulo a estrada principal é a BR-116 – Rodovia Regis Bittencourt – até a saída de Pariquera-Açu, mas a dica é evitar o trecho de serra a partir de São Lourenço da Serra, que contorna a perigosíssima Serra do Cafezal. O tráfego de caminhões pela pista única é intenso e tanto acidentes quanto quedas de barreira são muito freqüentes em qualquer época do ano. Melhor para quem sai de São Pauio é  iniciar a jornada pelo litoral, pelas Rodovias Anchieta ou Imigrantes, depois pela Rodovia Padre Manoel da Nóbrega – (SP-55) que vai das litorâneas Cubatão a Peruíbe, de onde parte para o interior passando por Itariri, Pedro de Toledo e Miracatu, chegando ao Vale do Ribeira no entroncamento com a Régis Bittencourt. É duplicada entre Praia Grande e Peruíbe e apresenta um trecho de pista simples em mão dupla entre Peruíbe e Miracatu que é menos utilizado, mesmo nos grandes feriados. A viagem fica um pouco mais longa (cerca de 25km) e mais cara (cerca R$17 de pedágio contra R$2 do caminho tradicional) mas muito mais agradável e bem mais segura. De Pariquerá-Açú a Cananéia  o trecho está em boas condições, é de pouco movimento e muito bonito. Ao chegar em Cananéia, opte pela ponte em vez da balsa, que é paga e não oferece qualquer atrativo que mereça a espera. Lá, estacione nas vagas cobertas do CEAGESP por R$10 a diária (preço em 2007).

– Como todo bom mochileiro, optar pelo ônibus é ecologicamente correto e a preocupação com o trânsito e o caminho desaparece por completo. Partindo de São Paulo para Cananéia há duas saídas diárias às 9:00 e 14:30 horas, com retorno às 7:00 ou 16:30 horas. A viagem é feita exclusivamente pela Intersul e a saída da capital paulista se dá no Terminal Barra Funda (11-3392-7566 / 6499).

– Para chegar a ilha, basta solicitar os serviços de qualquer barqueiro no cais principal, em frente a Igreja. O preço usual é de R$100 pela voadeira (2007), que leva até 6 pessoas, mas deve ser agendado antes, principalmente por conta da limitação de 14 barracas no núcleo do Perequê. Indicamos o Doca (13- 9727-3456 ou 13-3851-3219) que faz as reservas da barraca e agenda horários para ida e volta da ilha. Caso você deseje arriscar e o limite já tenha sido preenchido, pode tentar o Marujá, cuja oferta é bem maior (471 lugares em pousadas e 270 barracas) apesar de ser bem mais procurado. O bate-e-volta também é uma opção (confira opções de hospedagem aqui). Vinte minutos de voadeira pelo canal entre Cananéia e a Ilha do Cardoso, repleto de botos cinza no caminho.

– No Perequê existe um pequeno restaurante e um bar ainda menor, ambos de frente para a praia. O self-service do restaurante custa R$12 por pessoa (coma a vontade, comida bem simples) e as porções do bar são todas fritas e custam de R$10 a R$16.  A caipirinha de cataia sai por R$5 e as cervejas de R$2,50 a R$3. Só abrem na alta temporada e não funcionam à noite, pois o único movimento por ali é de barcos que ancoram para passar  o dia e retornam no fim da tarde. Ou seja: leve seus apetrechos de cozinha e comida.  À noite, curta o silêncio da praia e vá caminhar pelas praias desertas, cujo visual fica especialmente incrementado em noites de lua cheia.

– Criado em 03 julho de 1962 através do Decreto nº 40.139, o PEIC possui uma área de 15.100 hectares, totalmente protegidos e muito bem fiscalizados. Não faça bobagens, tipo acender fogueiras, arrancar árvores ou incomodar os animais. Além de ser uma atitude pouco inteligente, as multas não são das mais baratas.

– Há um posto de Saúde em Cananéia (Av. Luís Wilson Barbosa, tel: (13) 6851-1502). Caso você tenha algum problema, pode telefonar para seu barqueiro (não esqueça de levar celular e anotar o telefone dele) te buscar mais cedo. Tim e Claro pegam razoavelmente, porém apenas na praia.  Vivo só com esforço e laguma dose de sorte. As demais não atendem a região. No PEIC há estrutura de rádio, mas é uma opção complicada, sobretudo após às 17h. Telefone do parque: 13-6851-1163. E-mail:  peic@rgt.matrix.com.br.

– Dica: Sobre o Marujá, confira o excelente post da Carol no Mochilão Trips.

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3 comentários em “Ilha do Cardoso : Natureza Intacta ao lado de São Paulo”

    1. Fala Guidi, valeu pela visita!
      Cara, coloquei algumas fotos, realmente preciso dar uma revisada geral no post pois as coisas mudaram bastante por lá…

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